Em entrevista ao programa “Manhã Câmara”, o músico defendeu o diálogo entre a música erudita e outros gêneros musicais, como rock e o jazz
O maestro Jonicler Real, que durante anos foi o regente titular da Orquestra Sinfônica de Sorocaba, mantida pela Fundec (Fundação de Desenvolvimento Cultural de Sorocaba), concedeu entrevista ao programa “Manhã Câmara”, da Rádio Câmara, na manhã desta sexta-feira, 17, quando falou de sua trajetória artística e de seus novos projetos musicais. Na entrevista conduzida por Priscilla Radighieri, coordenadora da emissora, e Marcelo Araújo, o maestro também defendeu o diálogo entre a música erudita e outros gêneros musicais, como o rock e o jazz.
Conhecido por desenvolver vários projetos culturais em Sorocaba, tendo formado e regido várias orquestras na cidade e em outros municípios, Jonicler Real, aos 62 anos, também ressalta como fundamental em sua carreira o trabalho pedagógico. “Outro dia fiz um cálculo, por alto, e creio ter dado aula para cerca de 22 mil alunos, desde crianças para quem lecionei praticamente no berçário até alunos de faculdade. Isso é muito gratificante”, afirma o maestro, elencando algumas escolas nas quais trabalhou, como a Escola Mundo Novo, Escola “O Quintal”, Colégio Ser e Colégio Uirapuru, a instituição em que trabalhou por mais anos.
Confluências artísticas – O maestro conta que seu trabalho pedagógico não se limitou à música, também procurou despertar nas crianças e jovens o gosto artístico em geral e se orgulha de ter contribuído para formar alunos que depois se tornaram desenhistas, pintores, instrumentistas, cantores, atores etc. “Mesmo quando estou regendo uma orquestra sinfônica, não descuido desse lado pedagógico. Para mim, não basta executar a música, receber os aplausos e colher os louros; não, eu preciso também falar sobre a música, situá-la em seu contexto, falar do compositor, despertar a curiosidade das pessoas sobre o universo que envolve aquela obra”, afirma.
Uma das características do trabalho do maestro Jonicler Real, segundo ele próprio, é a busca do diálogo entre as diferentes formas de arte. Para ilustrar o que diz, cita exemplos de confluências artísticas diversas que podem ser vistas na própria história da arte, como o encontro, em 1973, entre o pintor surrealista espanhol Salvador Dalí (1904-1989) e o roqueiro norte-americano Alice Cooper, hoje com 76 anos. “Na época, Salvador Dalí fez um vídeo com o Alice Cooper. Mostrar esse tipo de encontro entre artistas que, à primeira vista, podem parecer dispares é uma forma de despertar os mais jovens para a arte”, argumenta Jonicler Real.
Primeiras influências – O maestro conta que não veio de uma família de músicos, mas seus pais, segundo se recorda, eram muito musicais e eram ouvintes assíduos de boa música. “Eu tinha uma mãe que era um pássaro, ela assobiava lindamente, era um canário. E além de ouvirmos muita música no rádio, ela tinha uma ‘Victrola’ [vitrola, em português] em que meus pais ouviam música popular brasileira, com grandes arranjos orquestrais, e música sertaneja de verdade, de duplas como Belmonte & Amaraí e Pedro Bento & Zé da Estrada”, conta. Recorda-se, ainda, de um vizinho que também influenciou seu gosto musical, chamado Vadão, que, por ter uma bela voz, chegou a cantar com ícones da música popular, como o cantor Francisco Petrônio (1923-2007).
Já o contato com a música erudita, segundo ele, começou quando, por volta dos sete, oito anos, morando na casa de um tio médico, ficava cuidando dos primos menores, e o tio lhe pedia para tocar discos de Bach, de Mozart, para as crianças. “Eu ficando brincando com as crianças e ouvindo esse tipo de música”, conta. Já na adolescência, passou a tocar violão e formar algumas bandas, optando, então, por cursar faculdade de música. “Sempre pensei, então, em fazer rock sinfônico e isso aconteceu, consegui isso em Sorocaba, há uns 25 anos. Creio, inclusive, que posso ter sido o primeiro a fazer isso no Brasil, não tenho certeza, mas até onde pesquisei, não encontrei nenhum caso na época”, afirma.
Erudito e popular – O maestro Jonicler Real observa que muitos músicos de rock têm ligações com a música erudita e vice-versa, citando os casos do músico vanguardista norte-americano Frank Zappa (1940-1993) e do pianista e tecladista londrino Rick Wakeman, atualmente com 75 anos. “Sempre gostei muito de Rick Wakeman, porque ele faz um rock sinfônico”, observa, lembrando de outras bandas cujos membros, ao menos alguns deles, também tiveram formação erudita, como Van Halen, Yes, Genesis, entre outras, além de Elton John. O maestro conta, ainda, que, antes da pandemia, chegou a pensar em fazer uma apresentação de rock sinfônico com a banda Sepultura, mas não foi possível.
Jonicler Real falou de outros trabalhos seus, juntando orquestra sinfônica com danças populares, desde samba até danças gaúchas e irlandesas. O maestro observa que outra fonte de inspiração para o seu trabalho é o cinema, onde também se encontra música de alta qualidade, com músicos do quilate do compositor e maestro norte-americano John Williams, hoje com 92 anos, autor de algumas das mais célebres trilhas sonoras do cinema, especialmente na filmografia do diretor Steven Spielberg, como “Tubarão” e “Os Caçadores da Arca Perdida”. “Aquilo é sinfonia pura, puro Mozart, puro Beethoven, nenhuma orquestra com menos de 120 músicos consegue tocar aquilo”, diz.
Música e autistas – Na entrevista à Rádio Cãmara, o maestro Jonicler Real também falou de sua atuação como professor, inclusive com alunos autistas, na Amas (Associação Amigos dos Autistas de Sorocaba). O maestro conta que esses alunos chegam a ser surpreendentes em sua criatividade, levando-o a apelidar um deles de “Haydn”, referindo-se ao compositor Joseph Haydn (1732-1809), pelo fato de que o menino (assim como Haydn fizera em seu tempo utilizando madeiras) improvisou um teclado no celular para estudar música uma vez que não tinha teclado em casa.
Jonicler Real discorreu também sobre seu empenho em levar a orquestra sinfônica para as ruas, como praças e outros logradouros, não só de Sorocaba, mas de outras cidades, como São Paulo, inclusive incentivando a participação de músicos amadores nessas apresentações. “Pegos a laço, quando estão passando no local”, brinca. Um desses novos projetos já tem data marcada: será no dia 16 de junho próximo, uma manhã de domingo, das 10 às 12 horas, quando vai se apresentar com uma banda de jazz dentro do Projeto Pintura Solidária.
Por fim, Jonicler Real lembrou de suas participações na Cantata de Natal – que era realizada em Sorocaba na gestão do então secretário de Cultura Anderson Santos, hoje servidor de carreira da Câmara e diretor da Escola do Legislativo. “Essa Cantata de Natal de Sorocaba precisava ser revivida, pois foi um projeto fantástico”, disse, lembrando também a Cantata de Natal que ensaiou e regeu com os funcionários da Câmara Municipal de Sorocaba A entrevista do maestro à Rádio Câmara foi transmitida também pela TV Câmara e está disponível nas redes sociais (YouTube e Facebook) do Legislativo sorocabano.