Iniciativa da vereadora Iara Bernardi (PT), a audiência contou com representante do Ministério da Saúde, entre outras autoridades
A situação da Atenção Primária à Saúde em Sorocaba foi debatida em audiência pública da Câmara Municipal, realizada na noite de terça-feira, 30, no plenário da Casa, por iniciativa da vereadora Iara Bernardi (PT), que presidiu a mesa dos trabalhos e a dividiu com as seguintes autoridades: vereadora Fernanda Garcia (PSOL); diretor da Regional de Saúde, Carlos Moura; diretor-presidente da Santa Casa de Misericórdia, padre Flávio Jorge Miguel Júnior; assessor de planejamento Vanderson Brito Santos, representando o secretário de Saúde, Cláudio Pompeu; e a enfermeira Regina Cardoso, do Comitê de Mulheres.
A coordenadora de Apoio Estratégico do Ministério da Saúde, Lívia de Paula Nascimento, participou virtualmente da audiência pública. Na mesa estendida estiveram representantes de diversos órgãos e entidades, como UBS do Carandá; Promotoras Legais Populares; Comitê Popular de Luta de Mulheres; Sindicato de Saúde de São Paulo; Conselho Municipal dos Usuários do Serviço Público; Sindicato dos Trabalhadores do Centro Paula Souza; Sindicato dos Funcionários da Fundação Instituto de Terras; Instituto Pleno Cidadania, representado pela ex-vereadora Tânia Bacelli, e o ex-vereador Antônio Sérgio Ismael.
Conforme explica o Ministério da Saúde, a Atenção Primária à Saúde caracteriza-se por um conjunto de ações de saúde, no âmbito individual e coletivo, que abrange a promoção e a proteção da saúde, por meio de diagnóstico, tratamento e manutenção da saúde com o objetivo de desenvolver uma atenção integral que impacte positivamente na situação de saúde das coletividades. Dela faz parte, por exemplo, a Estratégia de Saúde da Família. “A saúde básica é aquela que deve ser atendida na rede formadas pelas Unidades Básicas de Saúde e, nesta audiência pública, vou apresentar alguns números”, afirmou Iara Bernardi, ressaltando que a realização da audiência partiu de um pedido do Comitê de Mulheres pela Democracia.
“Cultura de Pronto-Atendimento” – A vereadora Iara Bernardi lembrou que o projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) já entrou em tramitação na Câmara Municipal e começará a ser debatido em audiências públicas, sendo uma oportunidade para se questionar as diretrizes referentes à saúde, como a construção de Unidades Básicas de Saúde, uma vez que, conforme enfatizou, a última UBS construída foi a do Carandá, financiada pelo Ministério Cidades. Em seguida, a vereadora apresentou os números da saúde, como o orçamento da área em 2023, que foi de R$ 841 milhões (R$ 610,1 milhões de recursos próprios; R$ 34,5 milhões oriundos de recursos estaduais; e R$ 197,1 milhões provenientes de recursos federais).
A Prefeitura de Sorocaba aplica na Atenção Primária à Saúde um montante de R$ 197,3 milhões de recursos próprios, somados aos R$ 4,9 milhões de recursos estaduais e R$ 22,2 milhões de recursos federais. Iara Bernardi destacou que os investimentos na Atenção Primária à Saúde giram em torno de 10% do montante. “A Atenção Primária à Saúde é o foco do nosso debate, pois se ela não estiver com a estrutura que é necessária, todos os outros níveis de saúde são prejudicados. Em Sorocaba, criou-se uma cultura de Pronto-Atendimento, então as filas se formam e aquilo que deveria estar sendo tratado na Unidade Básica de Saúde, com acompanhamento, pode virar um caso de hospitalização”, alertou a vereadora, destacando os números de filas de espera para atendimento em especialidades, com base em resposta do Executivo a um requerimento do vereador Ítalo Moreira (União Brasil) no final do ano passado.
A vereadora Fernanda Garcia (PSOL) disse que tem recebido várias denúncias de munícipes em relação à demora para serem atendidas na rede municipal de saúde na área de especialidades. “Houve uma redução do número de médicos no período da pandemia, muitos médicos tiveram de atender nas Unidades Básicas de Saúde e houve um sucateamento da Policlínica. Isso se reflete no aumento de pessoas na fila de espera por ortopedia, oftalmologia, dermatologia e várias outras especialidades”, afirmou, destacando também a questão da saúde mental, que, segundo ela, precisa de mais psicólogos para consultas clínicas. Para a vereadora, é preciso contratar mais médicos, enfermeiros e diversos outros profissionais.
Ampliação do atendimento – A representante do Ministério da Saúde, Lívia de Paula Nascimento, mestre em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), fez uma explanação sobre as ações do Governo Federal na área. “A Atenção Primária à Saúde é o único serviço que está presente nos 5.568 municípios brasileiros, alcançando cerca de 167 milhões de pessoas em todo o país. A nossa prioridade é a Estratégia de Saúde da Família, composta por médico, enfermeiro, técnico de enfermagem e agentes comunitários de saúde. Com isso, conseguimos trazer as demandas que emergem dos territórios e planejar nossas ações a partir dos agentes comunitários de saúde, inclusive levando em conta as especificidades locais”, explicou a representante do Ministério da Saúde, destacando a integralidade do cuidado que norteia a Atenção Primária à Saúde e enfatizando que essa atenção, quando bem estruturada, pode resolver cerca de 80% dos problemas de saúde da população.
Segundo ela, está sendo estudado um novo modelo de Estratégia de Saúde da Família, que não se limite a atender o indivíduo, mas também pense o território, o que exige uma equipe de cinco a seis agentes comunitários de saúde. Lívia Nascimento se prontificou a estudar o caso de Sorocaba para saber quantas equipes seriam necessárias no município, uma vez que a cidade poderia ampliar essas equipes. Segundo ela, com a volta do Programa Mais Médicos, está sendo possível ampliar o atendimento primário na cidade, colocando médicos em municípios mais vulneráveis. “A gente precisa ampliar, mas ampliar com qualidade, por meio do diálogo com os municípios”, enfatizou, destacando, por exemplo, a necessidade de ampliação das equipes de saúde bucal. Hoje, o país conta com 51.678 equipes de Saúde da Família e 267 mil agentes comunitários de saúde, que cobrem 80% do território nacional. No Estado de São Paulo são 6.647 equipes de Saúde da Família e 32 mil agentes comunitários de saúde e 60 equipes de consultórios na rua.
Crescimento populacional – O assessor de planejamento da Secretaria Municipal de Saúde, enfermeiro Vanderson Brito Santos, apresentou os dados de atendimento pelos territórios da cidade e observou que um dos grandes desafios de Sorocaba é o crescimento populacional, uma vez que a cidade cresceu muito nos últimos dez anos e parte dessa população vai demandar serviços de saúde pública.
Outro desafio, segundo ele, é o envelhecimento da população, com um novo perfil epidemiológico, em que mais pessoas irão conviver com doenças crônicas, demandando serviços especializados. O representante da secretaria também falou de conquistas da pasta, citando como exemplo a revitalização de 26 Unidades Básicas de Saúde, a implantação de prontuário eletrônico nas 33 Unidades Básicas de Saúde e o chamamento de servidores concursados, que, segundo ele, não ocorria há quase dez anos. “Dos 2.578 servidores que estão no Portal da Transparência, 1.275 são servidores que trabalham na Atenção Primária à Saúde”, contabilizou.
A enfermeira Regina Cardoso, do Comitê de Mulheres de Sorocaba, afirmou que o desafio é a necessidade de investimento: “Durante quatro anos, numa cidade que está em desenvolvimento, não se construiu nenhuma Unidade Básica de Saúde. Também precisamos de uma política de recursos humanos, pois os trabalhadores das unidades de saúde, hoje, trabalham muito, fazem muita hora extra para dar conta do atendimento. E é preciso rever nossos territórios, há muito tempo que a gente fez o último processo de territorialização e, desde então, Sorocaba cresceu muito e se modificou”, ressaltou, destacando, por exemplo, as pessoas com doenças pós-Covid que precisam de atendimento e as ocorrências de casos de sífilis.
Defasagem de prédios – O representante da Diretoria Regional de Saúde, Carlos Moura, disse que já visitou mais de 30 municípios dos 48 que compõem a Regional de Saúde e constatou que as unidades de saúde, em sua maioria, foram construídas há muito tempo e não atendem às demandas atuais. Também elencou outros problemas, como o grande número de funcionários que estão próximos de se aposentar; a necessidade de rever protocolos de atendimento, destacando a importância da enfermagem dentro das unidades de Atenção Primária à Saúde; a necessidade de planejamento e continuidade do atendimento. “Por que o atendimento em média e alta complexidade está aumentando? Porque, infelizmente, a atenção básica está tendo falhas”, alertou.
O padre Flávio Jorge Miguel Júnior, diretor-presidente da Santa Casa de Misericórdia, disse: “A sensação que tenho, na saúde de Sorocaba, é que temos a padaria vendendo carne e o açougue vendendo pão, ou seja, aquilo que era para ser tratado na unidade básica nós estamos tratando no hospital. A Santa Casa hoje tem uma grande quantidade de leitos clínicos, muito mais clínicos do que cirúrgicos, em que estamos tratando infecção urinária, diabéticos, problemas respiratórios, cardiológicos, tudo que não foi resolvido de forma preventiva e acaba ocupando os leitos hospitalares”, afirmou, discorrendo sobre a questão dos fluxos de atendimento na cidade, que, no seu entender, deve envolver todas as unidades de saúde e hospitais.
Após a fala de todos os integrantes da mesa, o debate foi aberto para os demais participantes da audiência pública e, entre os temas levantados, um dos destaques foi o atendimento dos casos de dengue. A vereadora Iara Bernardi disse que é preciso muita mobilização e cobrança. “Temos que partir para a luta, para a mobilização, porque o modelo da Prefeitura Municipal hoje, em termos de saúde, está falindo, é extremamente perigoso para a saúde das pessoas” – enfatizou. A audiência pública foi transmitida ao vivo pela TV Câmara e pelas redes sociais da Câmara Municipal de Sorocaba (YouTube e Facebook) nas quais poderá ser vista na íntegra.